ESPIRITUALIDADE ECUMÊNICA - Pe Paulo Gozzi
Todos os que trabalhamos no movimento ecumênico dentro da Igreja Católica percebemos que não é possível alcançar nossos objetivos se não possuirmos uma sólida espiritualidade ecumênica. Depois de analisarmos o decreto sobre o Ecumenismo do Concílio Vaticano II e também a carta do Beato João Paulo II sobre o mesmo assunto, vamos nos dedicar agora ao estudo de um recente documento elaborado pelo cardeal Walter Kasper, até a pouco tempo presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, com sede em Roma. Trata-se do Guia para uma Espiritualidade Ecumênica, que oferece sugestões práticas para realizar um ecumenismo mais eficaz.
O ponto de partida é justamente a grande oração que Jesus fez ao Pai, encontrada no capítulo 17 do Evangelho de São João. É interessante notar que Cristo não pede aos discípulos que sejam unidos, porque a unidade de seus seguidores não depende de arranjos e conchavos humanos, regras e normas para um bom relacionamento entre irmãos. Somente dentro da oração dirigida ao Pai é que ele manifesta seu desejo e faz esta súplica: “Para que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti” (Jo 17,21). A única ordem que o Senhor nos dá é que nos amemos como ele nos amou. A unidade é um dom que vem do alto. Amar depende de nós, mas sermos unidos depende de Deus.
Antes de conversar sobre nossas semelhanças e diferenças, quando nos encontramos com nossos irmãos de outras denominações, é preciso imitar o Cristo: Começamos pela oração dirigida ao Pai, unindo-nos à oração de Jesus, declarando-lhe nossa incapacidade em fazer comunhão. Brigar e nos dividir nós sabemos muito bem, mas não somos capazes de nos reconciliar. É o poder do Espírito Santo que irá fazer isso em nós e por nós. Em clima de fé e oração, sentindo humildemente nossa dependência de Deus, passamos a nos enxergar de modo diferente. O que conta não é o nosso ponto de vista teológico e sim os valores do Reino de Deus e a nossa comunhão fraterna.
O Salmo 127 nos dá a exata dimensão do ecumenismo: “Se o Senhor não construir a casa, é inútil o cansaço dos pedreiros. Se não é o Senhor que guarda a cidade, em vão vigia a sentinela”. Nossa abertura começa por um sério exame de consciência histórica. O Guia nos diz: “O caminho da unidade começa por uma profunda dor no coração pela ferida da divisão. Quanto dano tem sido provocado por orgulho e egoísmo, por polêmicas e condenações, por desprezo e presunção” (n° 6). Cremos que essa ferida só pode ser curada se mudarmos nosso modo de ver as coisas, tendo uma nova mentalidade, aberta e acolhedora, voltada para a realidade de nossos irmãos ainda divididos pela intolerância.